Bruce Lee ficou sem sua série de TV, mas ganhou amigos que trabalhariam com ele anos mais tarde. Nos primeiros meses de 1967, ele e Linda abriram uma academia de kung fu em Los Angeles, num prédio sem placas no bairro de Chinatown. Semanas depois da inauguração, o lugar parecia um set de filmagem de Hollywood, com atores e figuras famosas. O lutador, que fez um papel secundário num seriado de TV e conseguiu ser mais adorado que o protagonista, era disputado pelas estrelas de cinema como professor de lutas marciais. Steve McQueen, Lee Marvin, James Coburn, James Gardner, Chuck Norris, o gigantesco jogador de basquete Kareem Abdul-Jabbar, da NBA, e o diretor Roman Polanski foram ter suas aulas particulares com Bruce Lee. Preço: 500 dólares por um curso com dez aulas. Como aconteceu com os estudantes da Universidade de Washington, a fama de lutador eletrizante correu rápido entre os atores de LA. “Ele parecia um super-hcrói”, dizia Lee Marvin. “Seu estilo era uma novidade irresistível para quem atuava em filmes de ação. A luta dele tinha muito apelo visual.”
O ator Lee Marvin lembrou, no documentário The Curse of tbe Dragon, que certa vez Bruce Lee foi ensiná-lo a chutar um desses sacos gigantes para atletas de futebol americano: “fie dizia que eu não estava fazendo o movimento certo e foi demonstrar como deveria dar o pontapé. Acertou com tanta força o saco, num chute, que o saco se desintegrou, explodiu. A areia se espalhou e Bruce só reclamou que teria que comprar outro.”Seus amigos e ele próprio perceberam que os produtores de TV não o chamavam por ser de origem oriental, o que ficou claro quando Bruce fez teste para o seriado Kung Fu. Apesar do enredo insólito – a série narrava a vida de lutadores de artes marciais no Velho Oeste americano -, era um programa que prometia audiência, porque passaria à noite e seria produzido pela Fox. A empresa, conhecida por emplacar sucessos na TV e no cinema, fez testes com vários atores para o papel principal. Bruce tinha sido recomendado por amigos e pelo seu ex-produtor de Besouro Verde, William Dozier. Foi até os estúdios e, como de hábito, deixou diretor, câmeras e contra-regras boquiabertos ao simular uma luta com dublés, com sua incrível impulsão nos saltos, golpes velozes e técnica inspirada. Só faltou ser aplaudido de pé e ovacionado, como ao fim de uma ópera do pai. Saiu dali com a certeza de que passaria os meses seguintes decorando pequenos textos c coreografando as mais impossíveis lutas no Velho Oeste. E mais: seria o papel que daria a ele o lugar tão esperado numa grande produção de cinema.
Semanas depois, quando soube que o papel tinha sido entregue a David Carradinc, ator de presença cênica mas não tão experiente como ele cm lutas na tela, ficou furioso. Ligou para produtores c soube que perdera a chance de ser protagonista porque a direção da Fox considerava que um ator de descendência chinesa poderia não receber identificação do público americano e atrair grande audiência. Brucc passou a se queixar de racismo. Teve vontade de se mudar para Hong Kong, onde a série Besouro Verde também era famosa. Mas Linda o convenceu de que era melhor continuar dirigindo as academias – as três, já que as de Oakland e Seattle ainda funcionavam – e esperar por uma nova chance. Ele passaria os dois anos seguintes tentando, sem sucesso, emplacar um papel na TV. Em 1969, as academias já não davam tanto lucro. A família Lee enfrentou problemas de dívidas e falta de dinheiro para o aluguel. Bruce, segundo amigos, ficou mesmo abalado. Deprimido, diminuiu o treinamento diário e até emagreceu – as estimativas variam de 5 a 10 quilos. A única grande notícia do ano para ele e para a mulher foi o nascimento, em 19 de abril de 1969, do segundo filho do casal, uma menina batizada de Shannon. A situação econômica dos Lee ainda estava crítica cm 1970. Sem TV nem cinema, e com menos alunos nas academias, tiveram que economizar. Para suavizar a má fase, Bruce Lee preferiu recuperar a forma. Então voltou a treinar, forte como antes – com bolas medicinais, haltcres, sacos de um gigantes e os menores de boxe, correr, dar arrancadas. Num desses treinos, enquanto levantava haltcres, caiu de mal jeito e bateu de costas. Gemeu de dor, tentou se levantar e pareceu sentir uma dor ainda mais aguda. Foi o pior nocaute de sua vida até aquela idade.
A lesão, séria, atingia o quarto nervo sacral nas costas. Bruce ficaria seis meses no hospital, parte desse período obrigado a ficar de bruços, se recuperando do baque. Foi pelo menos uma época de descanso e, como ele dizia, “de reflexão”. Aproveitou para tentar colocar no papel algo que vinha elaborando nos últimos anos – as bases de um novo estilo de luta oriental.
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